Ivan Ilitch alcançou um estágio na vida em que estava casado, tinha filhos, contava com um bom emprego, desfrutava de conforto e cultivava relações sociais importantes.
Observando superficialmente a vida desse homem, é praticamente impossível não pensar que ele alcançou a realização pessoal. Contudo, o que ninguém imagina é que por trás desse cenário existe um marido infeliz, um homem que chegou a ter o trabalho como um meio para não precisar lidar com a esposa e suas reclamações, alguém com muitos conhecidos, mas talvez nenhum amigo.
Apesar de uma vida vazia e mentirosa, Ivan Ilitch só conseguiu enxergar a pobreza da própria existência quando foi surpreendido por uma doença fatal.
Diante desse sofrimento, esse homem à beira da morte encontrou algum consolo na amizade de Guerássim, um indivíduo simples que trabalhava como ajudante de copeiro em sua casa. E o que mais surpreendia Ivan era como esse jovem humilde encarava a vida.
Em seus últimos dias, ele também passou a encontrar algum contentamento em suas lembranças. E eram nas recordações da infância que se deparava com algo realmente agradável.
Em A morte de Ivan Ilitch, o leitor observa o desfecho da vida de um homem e a transformação de sentimentos e questionamentos que o perseguem até o último suspiro.
Considerações
Acompanhar Ivan Ilitch se despedindo de forma tão dolorosa da própria vida é uma experiência de alto impacto para qualquer leitor. Afinal, apesar de termos a consciência de que a morte um dia baterá à nossa porta, a vida agitada, as preocupações fúteis e o uso de entretenimento como escape da realidade nos distraem.
A nossa ingenuidade consiste justamente em esquecer por completo que um dia também teremos um fim. Claro que diante de uma leitura marcante como esta, doença ou falecimento de alguém próximo o indivíduo tende a lembrar dessa verdade.
Mas sabe o que é mais triste e, de certo modo, até assustador? Perceber que — apesar do sofrimento e do choque que levamos quando esses marcos acontecem — sempre voltamos às mesmas futilidades e continuamos a desperdiçar nossa oportunidade de viver melhor.
“A morte de Ivan Ilitch” foi publicado em 1886, 4 anos depois de “Uma Confissão”, texto de não ficção no qual Tolstói avalia sua vida e expõe sua busca pelo sentido da existência.
A experiência de ler a novela após “Uma Confissão” pode dar ao leitor a possibilidade de encontrar refletidas no protagonista as angústias e inquietações do autor. Confira estes dois trechos de “Uma Confissão”:
“Parecia que eu tinha vivido e andado para lá e para cá, até chegar à beira de um abismo, e via com clareza que não havia nada na minha frente, a não ser a ruína. E é impossível parar, é impossível voltar, é impossível fechar os olhos e deixar de ver que não existe nada à frente, a não ser a ilusão da vida, da felicidade, os sofrimentos verdadeiros e a morte verdadeira — a aniquilação completa.”
“Em oposição ao que eu via em nosso círculo, onde toda a existência transcorre em festas, diversões e insatisfação com a vida, eu via que toda a vida daquelas pessoas se passava em meio ao trabalho pesado e que elas eram menos insatisfeitas com a vida do que os ricos.”
“A morte de Ivan Ilitch” me afetou na mesma proporção que “O Deserto dos Tártaros”, e não tenho dúvidas de que preciso ler novamente de tempos em tempos para que meu senso de finitude não fique adormecido por muito tempo e só desperte quando for tarde demais.
Se você gostou desta resenha de “A morte de Ivan Ilitch”, aproveite a visita para conferir também "Uma Confissão"!
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