Dostoiévski publicou as novelas “A dócil” e “O sonho de um homem ridículo” pela primeira vez em novembro de 1876 e abril de 1877 na revista mensal que ele próprio redigiu e editou, o “Diário de um escritor”.
Em “A dócil”, um marido tem sobre a mesa de casa o corpo de sua mulher que há pouco se jogou da janela. Transtornado, o homem tenta reunir seus pensamentos e esclarecer a história para si mesmo.
Durante boa parte do casamento, sentia necessidade de subjugar a amada. Ele conduziu a relação com silêncio, frieza e indiferença. Ao tentar dar uma chance à felicidade, percebe que se tornou um estranho para a mulher.
Enquanto se recorda da história, o narrador oscila entre justificativas e acusações até chegar à compreensão da verdade que se revela de modo definitivo.
Em “O sonho de um homem ridículo”, um homem se depara com uma menina na rua pedindo ajuda, mas ignora completamente a aflição da criança. Afinal, ele decidiu se tornar uma pessoa indiferente a tudo e tem planos de pôr fim à sua vida.
Quando chega o momento de cumprir seu propósito, o homem dorme sentado na poltrona que costumava passar as noites acordado e tem um sonho impactante.
No sonho, entra em contato com uma sociedade plena, sem dor, sem violência e livre do egoísmo. Uma sociedade na qual as pessoas são serenas e vivem a “vida viva”, aquela que vai além da consciência da vida.
Mas algo lastimável acontece no sonho, e o protagonista se depara com a verdade que o faz enxergar a raiz dos seus males. Agora, existe uma imagem viva de algo que vai sempre estar com ele e dirigir sua vida.
Nos dois textos, os narradores são homens que carregam o subsolo na alma. A escrita de Dostoiévski consegue capturar a angústia desses indivíduos, desafiando o leitor a entrar em contato com a própria escuridão.
Esse contato oferece ao leitor uma percepção desconfortável de sua condição. Essa noção incômoda pode impedi-lo de afundar em uma individualidade obstinada, pode ser o apoio necessário para que, ao menos, ele se desfaça de algumas percepções autocentradas e ultrapasse a barreira que tem dificultado sua chegada à fonte que dá fôlego à vida.
Se você curtiu esta ideia sobre "Duas Narrativas Fantásticas", aproveite a visita para ler também "Memórias do subsolo"!
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